Existe algo deliciosamente ousado em uma continuação que decide não repetir a fórmula, mas sim segura pelos cabelos e empurra a cara do público para outra direção. Aqui, essa mão segue firme até nos jogar em um caminho frio e banhado em trevas. Esse é o caminho de O Telefone Preto 2 (Black Phone 2), e é justamente por isso que gostei tanto.
Se no primeiro filme ainda havia uma camada mais contida, quase metafórica, de amadurecimento com tons de Stephen King, aqui o jogo muda: estamos vendo o nascimento oficial de uma franquia de horror à moda antiga, daquelas em que o vilão pode voltar quando o medo deixa brechas. Ou quando o mercado faz sua magia para invocar uma nova continuação.
Mas aqui estamos em boas companhias.
Quatro anos se passaram desde que Finney (Mason Thames) matou o sequestrador mascarado (The Grabber, no original). Livre das fivelas da matéria, agora o personagem de Ethan Hawke retorna como espírito, invadindo sonhos, provocando alucinações e atormentando Gwen (Madeleine McGraw), que continua lidando com suas capacidades psíquicas como quem aprende a carregar uma cruz.
Ao lado deles, entra em cena Miguel Mora como Ernesto. Juntos eles sobem as geladas montanhas do Colorado para um acampamento cristão, prontos para descobrir e confrontar os traumas.
Ligações Perigosas
Mas o que mais me fisgou foi a mudança de tonalidade estética. O Telefone Preto 2 parece completamente apaixonado pela linguagem do terror de internet, brincando com granulação de VHS, distorções de imagem, cortes secos e até aquela estética de creepypasta e iceberg horror popularizada em canais como Semideus e Lucas Nauta.
E uma piscadinha para isso é a inclusão da Lost Wave “Subways of Your Mind” (Like the Wind) na trilha sonora. Antes conhecida como “música mais misteriosa da internet”.
E o mais curioso é como essa virada estética vem acompanhada de uma releitura do próprio vilão. O Grabber agora está mais para Freddy Krueger do que para serial killer realista.
Ele invade mentes, manipula, sussurra, distorce memórias. Não é mais apenas um sequestrador mascarado, é um fantasma que se recusa a ser esquecido.
E ao invés de repetir o jogo de sobrevivência do primeiro filme, a continuação prefere explorar o terror como cicatriz psicológica, sobretudo em Finney, que virou alguém endurecido, agressivo, e usuário de ilícitos. É como se para continuar vivo ele tivesse se tornado um pequeno monstro também.
Talvez aí esteja a maior força do filme: ainda que entregue sustos e imagens perturbadoras, ele entende que fantasmas são metáforas antes de serem entidades. O Grabber existe, sim, como espírito assassino mas também como alegoria da dificuldade de superar o passado.
Então, respondendo à pergunta que muitos farão: dá pra assistir sem ver o primeiro? Dá. Porque agora, mais do que um thriller bem escrito, O Telefone Preto virou uma verdadeira franquia de terror, assumida, clássica, pronta para seguir os passos de Jason ou Michael Myers. Alguns vão achar isso menos sofisticado. Eu acho honesto, eficiente e umasólida experiência de horror.
O telefone tocou de novo. E eu atendi sorrindo.
The Black Phone 2 | Review
Distribuição, Universal Pictures
Ano de lançamento: 2025
Duração: 114 min
Direção: Ryan Crego
Elenco: Ethan Hawke, Mason Thames, Madeleine McGraw.
Classificação Indicativa: 18 anos
Assista ao trailer completo e dublado:

